quarta-feira, 4 de outubro de 2006

Artigo: "Apuração dos lucros"

Apuração dos lucros
Por Daniele Camba e Danilo Fariello
04/10/2006


A surpresa de um segundo turno para a Presidência da República mudou o cenário para os investimentos. A situação do mercado já não é mais tão clara, ganhando alguns ingredientes de instabilidade. Neste mês, o que se espera é uma boa oscilação dos ativos até que se defina quem irá governar o país. No longo prazo, há entre os dois candidatos distinções que podem ser relevantes para o destino das aplicações. Enquanto a resposta das urnas não vem, os especialistas recomendam que os investidores fiquem atentos ao desenrolar da campanha para encontrar oportunidades de ganho em meio à volatilidade.

Num primeiro olhar, tanto Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, quanto Geraldo Alckmin, do PSDB, parecem para o mercado boas opções, já que devem dar continuidade à política econômica atual. "Como o Brasil melhorou muito em termos de fundamentos, não há o menor incentivo para grandes mudanças", avalia o sócio da Tendências Consultoria Roberto Padovani.

Segundo analistas, existiria uma preferência do mercado pelo tucano por ele representar uma chance maior de implementação de algumas reformas importantes - como a da previdência e a política. "Alckmin tem mais clareza de quais reformas são necessárias, por isso sua vitória representaria um potencial maior de valorização no mercado", diz Padovani.

Não é o momento de correr grandes riscos nas aplicações, já que o destino da eleição ainda é incerto, alerta o sócio da Mauá Investimentos e ex-diretor de Política Monetária do Banco Central Luiz Fernando Figueiredo. Mas também não é preciso exagerar e colocar todo o dinheiro em investimentos conservadores, diz. "O cenário é neutro, mas levemente positivo." Esse tom "levemente positivo" poderá ganhar força se Alckmin crescer nas pesquisas. "Dependendo das chances dele ganhar, o mercado fica exuberante e oferece bons ganhos."

O histórico de Alckmin de bom gestor também agrada ao mercado. Com uma possível eleição do candidato tucano, haveria uma maior possibilidade de privatizações ou pelo menos de uma melhora na rentabilidade das estatais, com menos indicações políticas para cargos executivos, acredita a chefe de análise da Fator Corretora, Lika Takahashi.

"Mesmo que o Banco do Brasil não seja privatizado, suas ações vão subir porque o mercado acredita em uma melhora na instituição", diz Lika. Essa visão já se refletiu nas ações de algumas estatais. Na segunda-feira, os papéis da Eletrobrás e do Banco do Brasil subiram 4,79% e 3,78%, respectivamente. Também existe expectativa de que um governo PSDB dê mais autonomia às agências reguladoras e reforce as concessões, como de saneamento e rodovias. "Isso pode beneficiar ações como da Sabesp, OHL e CCR, por exemplo, além dos papéis de setores regulados, como teles e elétricas", diz o chefe de análise da Ágora, Marco Melo. Essas valorizações, no entanto, poderão evaporar se o cenário não se concretizar. "São especulações", diz.

No curto prazo, as expectativas são otimistas por conta da eleição, com reflexos em ativos como a bolsa. "Qualquer dos dois candidatos têm um discurso pró-reformas, e há ainda o lado psicológico de um novo governo aumentar as esperanças de mudança", diz o estrategista chefe do UBS, Marcelo Mesquita. Esse otimismo deve levar o Ibovespa para os 40 mil pontos até o fim do ano, estima ele.

No entanto, ainda é interessante manter boa parte dos investimentos em aplicações atreladas por juros, diz Gaspar Gasparian, sócio da consultoria Sankt Gallen. "Indicamos para aplicações mais arriscadas principalmente os multimercados long/short, que podem apresentar maior ganho com a volatilidade." Os multimercados com estratégia macroeconômica também podem apresentar diferencial, com menos incertezas do que investir direto em bolsa até uma definição eleitoral.

Apesar das atenções voltadas para as urnas, o principal risco continua vindo do setor externo - o nível de desaceleração da economia americana - muito mais imprevisível, diz o sócio responsável pela gestão de fundos do Pactual, Rodrigo Xavier. "Mais por conta disso, não aplicamos em ativos de renda fixa de prazo muito longo, porque preferimos papéis de maior liquidez." Xavier prevê que o cenário só ficaria mais instável por motivos internos se surgissem novos escândalos. "Haveria mais espaço para lucrar ou perder, em um fundo multimercado."

Para o longo prazo, Gasparian prevê cenários distintos para os investimentos de acordo com o candidato eleito. Com Lula, o início do próximo mandato poderá ser marcado por turbulências com a apuração das denúncias de corrupção, diz. "A bolsa poderá sofrer com essa instabilidade e o câmbio subir." Se o eleito for Alckmin, o consultor espera uma redução mais forte dos juros, o que beneficiaria os investimentos prefixados e tornaria o cenário mais positivo para as ações. "Alckmin ainda poderá também adotar uma política cambial mais flexível, para estimular as exportações, o que beneficiaria a aplicações em fundos cambiais."

O desempenho dos ativos também dependerá de as reformas saírem do discurso. "Se isso ocorrer, a bolsa terá fôlego para mudar de patamar e chegar em 50 mil pontos", diz Mesquita do UBS. Se não saírem do papel, na melhor das hipóteses as ações ficarão onde estão hoje..(Colaborou Angelo Pavini)

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