terça-feira, 3 de outubro de 2006

Artigo: "Alguns motivos para o investidor revisar suas aplicações"

Alguns motivos para o investidor revisar suas aplicações
Gilberto Poso
03/10/2006


Muito se discute atualmente sobre as possibilidades de queda nos juros básicos no Brasil e seus respectivos benefícios. Certamente, tais discussões são de extrema relevância, dados os impactos nas empresas, nas pessoas e na economia. A idéia deste artigo, no entanto, é avaliar três dos impactos positivos das quedas de juros sobre os investimentos, particularmente sobre a distribuição dos recursos para os mercados de crédito e acionários.

Antes de tudo, para que os impactos sejam substanciais, é fundamental que as quedas valham para os juros nominais e para os juros reais. Além disso, precisam ser sustentáveis. Não pretendemos estender o debate sobre as necessidades para que tal ambiente se produza, tema bastante explorado em diversos artigos. Por ora, trabalharemos com o cenário de uma redução gradual e duradoura das taxas básicas.

Começando pelas empresas, a avaliação de projetos, expansões ou novos negócios/produtos está ligada, entre outros fatores, ao retorno previsto sobre o investimento. A análise usualmente compara o retorno esperado com a taxa de juros prevista. Para a idéia prosperar, o retorno do projeto deve superar a taxa de juros e ainda recompensar os riscos assumidos pelo(s) investidor(es). A perspectiva de queda dos juros reais aumenta as chances de projetos serem aprovados ou de negócios serem ampliados. Como novos projetos ou negócios visam o aumento de lucros futuros, sua viabilidade torna os papéis dessas empresas mais atraentes. Pelo lado do crédito, a redução dos juros reduz o custo de capital, abrindo espaço para empresas aumentarem suas captações em níveis compatíveis com seus desempenhos operacionais e para colocação de novas alternativas de crédito.

Do ponto de vista financeiro, a queda dos juros afeta positivamente o valor de uma empresa: os principais parâmetros dos modelos de avaliação são a expectativa de lucros/geração de caixa futuros (tratados no parágrafo anterior), o prêmio de risco (função das condições macroeconômicas) e a expectativa de juros para longo prazo. Esta última, seja por meio da remuneração dos Global Bonds ou a da taxa embutida nos títulos indexados à inflação, é utilizada para descontar o fluxo futuro de caixa ou fluxo futuro de dividendos. Todo o resto mantido igual, quanto menor a taxa de desconto, maior o valor percebido para a empresa. A avaliação de crédito das empresas também é influenciada positivamente pela queda nos juros: menor nível de juros representa menor serviço de dívida, parâmetro importante na classificação ou revisão de títulos/empresas.

Finalmente, a queda dos juros afeta as decisões dos investidores também pelo lado da remuneração global de seus investimentos: a maioria dos investidores - embora não a totalidade - define suas alocações primeiramente em função dos retornos potenciais. Quando a remuneração proporcionada pelos juros satisfaz os objetivos de rendimento, não há razão para o investidor preocupar-se com alternativas de investimento. Entretanto, diante da queda dos juros, outras alocações ganham atratividade. Como o segundo fator importante na decisão é o risco associado ao investimento, a migração não ocorre exclusivamente para o mercado acionário. Parte é migrada para alternativas que proporcionem rendimentos ligeiramente superiores e parte é redistribuída para outros mercados. Por isso, a queda dos juros está normalmente associada a: 1) Aumento na captação de títulos privados, fundos de recebíveis e outras securitizações; 2) Aumento da aceitação por títulos de longo prazo e títulos de rendimento prefixado; 3) Aumento da participação relativa de ações nas carteiras de investimento.

De fato, a participação de investidores pessoas físicas no mercado brasileiro aumentou em 2006, de 23% para 26%, mesmo com o baixo crescimento brasileiro. Na mesma linha, de acordo com relatório divulgado pela Bear Stearns (Bear Stearns' Latin America Watch, set/06), a participação de fundos de ações e fundos balanceados sobre o total de fundos é de aproximadamente 7,3%, comparáveis à média de 28,9% num grupo de 13 países emergentes.

Os três aspectos comentados apontam para uma inexorável e saudável redistribuição de investimentos no Brasil durante os próximos anos. Naturalmente, tal realocação não ocorrerá de forma uniforme e sem tropeços. Entretanto, esses já são motivos suficientes para que os investidores revisem seus investimentos para os próximos anos.

Gilberto Poso executivo-sênior de Investimentos do HSBC Private Bank

Valor Econômico: Mais Brasil - 03/10/2006

Mais Brasil
Por Daniele Camba
03/10/2006

Mesmo com as incertezas sobre o cenário eleitoral, com a surpresa de um segundo turno para presidente da República, os analistas ainda se mostram otimistas com relação ao crescimento econômico do país em 2007. Seja Lula ou Geraldo Alckmin o novo governante, há consenso de que a condução da política econômica na linha da estabilidade será mantida, com inflação controlada, redução da taxa de juros, superávit primário e balança comercial robusta. Permanecem, assim, intactas as projeções de um crescimento mais vigoroso do PIB para os próximos anos. Para se beneficiar do movimento, as corretoras participantes da Carteira Valor intensificaram as recomendações de papéis voltados ao mercado interno. Entre as sugestões estão ações de varejo, consumo, bancos e energia.

Apesar do tom de tranqüilidade, a disputa eleitoral deve trazer um pouco de volatilidade para a bolsa este mês. A oscilação pode aumentar significativamente caso novos escândalos venham à tona. "A perspectiva é de uma bolsa para cima até o fim do ano, com o Índice Bovespa chegando a 42 mil pontos em dezembro, mas até lá muito sobe-e-desce ainda está por vir", diz o chefe de análise da Concórdia Corretora, Eduardo Kondo. Os resultados tradicionalmente melhores das companhias no terceiro e quarto trimestres devem ser um empurrão importante para as ações se valorizarem.

Se o céu parece razoavelmente limpo no Brasil, o mesmo não acontece em terras estrangeiras. Apesar de descartarem a possibilidade de uma brusca desaceleração da economia americana, ou até de recessão, os analistas acreditam que as ações voltadas ao mercado externo, como as de commodities (petróleo, mineração, siderurgia, papel e celulose), continuarão altamente voláteis, oscilando a cada nova notícia ou indicador sobre o comportamento da atividade econômica nos Estados Unidos.

"Não vemos risco de uma desaceleração mundial, mas achamos que, no curto prazo, enquanto essa desaceleração suave não se definir, haverá turbulência nas ações de empresas expostas ao comércio internacional, como são as commodities", diz o chefe de análise da Bradesco Corretora, Carlos Firetti.

Por esse motivo, as dez corretoras da Carteira Valor praticamente abandonaram alguns papéis de commodities que são vedetes da bolsa brasileira. As ações da Petrobras e da Vale do Rio Doce, por exemplo, historicamente apareciam entre as recomendações de sete ou oito corretoras. Mas na carteira deste mês, as preferenciais (sem direito a voto) da Petrobras têm quatro recomendações e as PNA da Vale somente três. "Não ter esses papéis nos últimos dois meses se mostrou uma estratégia vitoriosa, foi o que fizemos", diz Firetti.

As recomendações da Bradesco Corretora, assim como as sugestões das demais participantes da Carteira Valor, estão voltadas ao crescimento interno. É o caso das ações da Dasa, laboratório de diagnósticos que está em crescimento e com expectativa de fazer aquisições. A corretora também incluiu na carteira os papéis da Net, que está se beneficiando com o aumento da massa real de salários.

A Concórdia também fez várias mudanças na carteira deste mês para se beneficiar da melhora da atividade econômica. A corretora recomenda ações da Confab (fabricante de tubos) e da Lupatech (produtora de válvulas para postos de gasolina), ambas fornecedoras da Petrobras e que devem se beneficiar do aumento de 75% nos investimentos da estatal, diz Kondo.

Depois de um bom tempo relegadas a segundo plano, as ações de energia voltaram à pauta de prioridades dos analistas. Os papéis da Cemig, CPFL Energia e Light possuem duas recomendações cada uma. "O setor inteiro está defasado na bolsa, além disso, com o crescimento econômico, será preciso fazer investimentos em geração, do contrário faltará energia", diz Gilberto de Souza, chefe de análise da BES Securities. As geradoras devem se beneficiar mais desses investimentos do que as distribuidoras.

"A Light, uma das empresas que mais perdem com as ligações clandestinas no Rio, deve sofrer uma reviravolta de eficiência agora que foi comprada", diz o analista da corretora do Banco Real, Pedro Galdi. Além da Light, a corretora recomenda as ações ordinárias (com direito a voto) da Eletrobrás.

As ações de algumas estatais, como a própria Eletrobrás, subiram ontem, com a ida de Alckmin para o segundo turno. "Isso reacendeu as esperanças de uma gestão melhor nessas companhias e até de privatização", diz Firetti, da Bradesco Corretora. No mês passado, a Carteira Valor teve alta de 1,47%, acima do Ibovespa, que subiu 0,60%. No ano, a Carteira acumula 20,78%, para 8,95% do Ibovespa.